Segundo matéria veiculada pelo jornal O Estado de S. Paulo, os recursos federais enviados aos Estados para aplicação na área da segurança pública chegaram a R$ 1,2 bilhão ao longo de 2020. O repasse é feito pelo Fundo Nacional de Segurança Pública, cujo contingenciamento (bloqueio) foi vetado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) desde o fim de 2019.
Embora seja um avanço na disponibilidade de dinheiro para uso das polícias, especialistas ainda veem entraves e Estados criticam a forma atual de divisão do montante.
De acordo com a reformulação feita em 2018, o fundo quando passou a prever fonte fixa de recursos – uma porcentagem da arrecadação das loterias federais. Ficou estabelecido por força de lei que ao menos 50% da verba tem de ser repassada aos Estados para aplicar em ações compatíveis com planos locais de melhoria da segurança pública.
Já no primeiro ano, em 2019, o repasse foi restrito a R$ 247 milhões de um fundo orçado naquele ano em R$ 1,8 bilhão. Em dezembro de 2019, o STF atendeu a pedido dos Estados para proibir o contingenciamento, previsão expressa na lei que reformulou o fundo.
Em 2020, de acordo com dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública, R$ 1,2 bilhão foi distribuído em divisão para todos os Estados. O fundo estava orçado em R$ 2,2 bilhões, no total, e o ministério empenhou até o fim do ano 94,6% do previsto, tendo usado a verba também para ações federais, como operações da Força Nacional de Segurança, em que empenhou R$ 204 milhões.
Problemas
O Instituto Sou da Paz analisou a execução orçamentária do fundo junto ao Sistema Integrado de Planejamento e Orçamento (Siop), do governo federal, e apontou “fragilidades”. Uma delas é a concentração do uso do dinheiro público no fim do ano. Até novembro de 2020, 41% do total tinha sido empenhado, o que subiu para 94,6% no mês seguinte. Isso representa, avalia a organização, um risco de as despesas não terem o pagamento efetivado devidamente, além de afetar a programação para aplicação desse dinheiro ao longo do ano.
Outro problema apontado foi o baixo uso das verbas reservadas a ações emergenciais na pandemia. A previsão foi criada em abril e previa aplicação de R$ 225,5 milhões para medidas de combate à covid-19, como a aquisição de equipamentos de proteção individual (EPIs) para profissionais de segurança pública. Mas menos da metade do previsto (R$ 105 milhões) foi usado.
“Pode ser dito que houve um avanço, mas estamos muito longe de ter instalado uma capacidade de excelência no uso dos recursos federais. É um primeiro passo e 2021 vai ser um ano crucial para ver se estamos a caminho de uma mudança efetiva”, diz a diretora-executiva do Sou da Paz, Carolina Ricardo.
Ela destaca que o aumento do repasse ocorre diante da pressão dos governadores, que foram ao STF contra o contingenciamento de 2019. “É uma relação que tem permeado o governo Bolsonaro: o Judiciário entrando para fazer valer legislações, colocá-las em prática”, acrescenta.
Sobre o baixo uso de recursos voltados ao combate à covid-19, Carolina vê “falta de competência e vontade política”. “Vemos refletido no Ministério da Justiça a mesma falta de capacidade e coordenação política em relação à pandemia que a gente vê no Ministério da Saúde”, diz.
Enquanto avança nos repasses aos Estados, o Ministério da Justiça vê os critérios para definição da cota serem questionados pelos secretários estaduais. Os critérios inicialmente definidos levavam em consideração dados de população, efetivo policial, além de pontos como fronteira e indicadores de criminalidade violenta.
Esse formato fez com que em 2020 o maior porcentual estabelecido tenha sido o de Mato Grosso do Sul, com 5,7% do total. A porcentagem para São Paulo ficou em 5,5%. As cidades paulistas somam uma população que supera em mais de 40 milhões a população sul-mato-grossense (de 2,6 milhões), mas não estão situadas em área de fronteira e possuem os índices de homicídio mais baixos do País.
Ao Estadão, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo disse que o porcentual destinado ao Estado foi reduzido entre 2019 e 2020, o que teria representado uma perda superior a R$ 7,8 milhões. “Essa decisão representou uma diminuição de 15,73% no total de recursos federais destinados a São Paulo em 2020 se comparado ao ano anterior. Os dados reforçam a necessidade de um reestudo dos percentuais de rateio e distribuição do programa entre os entes da federação”, declarou a pasta paulista.
A Secretaria de Segurança de Minas, para quem foi destinado 2,7% do total, disse que a revisão dos critérios de rateio é necessária, levando em consideração a faixa de divisas com outros Estados, além da quantidade de profissionais de segurança em atividade e o tamanho da população, “a segunda maior do País”.
O Estado informou que o fundo tem grande relevância, “conferindo maior agilidade aos repasses e, sobretudo, permitindo a implementação de programas, projetos e ações que visam a integração, a interoperabilidade e o aprimoramento das instituições que compõem a política de segurança pública e defesa social do Estado”.
