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Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra aumento no número de denúncias de violência doméstica

A segunda edição do boletim sobre violência doméstica durante a pandemia de Covid-19, divulgado nesta segunda (1/6) pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostra o crescimento de 22,2% dos feminicídios entre março e abril deste ano. Além disso, houve aumento de 6% nos homicídios dolosos de mulheres. Os dados revelam ainda a redução de 25,5% dos registros de agressão em decorrência de violência doméstica e de 28,2% dos registros de estupro e estupro de vulnerável. Se as mulheres estão morrendo mais, denunciar o agressor em uma delegacia de Polícia parece estar mais difícil em meio a uma crise sanitária sem precedentes ou data para acabar.

Apesar da redução dos registros de boletim de ocorrência, verificada em todos os estados, o ligue180, central nacional de atendimento à mulher gerida pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), viu crescer em 34% as denúncias em março e abril de 2020 quando comparado com o mesmo período do ano passado. Os registros de atendimentos de violência contra a mulher registrados pelas Polícias Militares no 190 também cresceram, mas não é possível saber se o acionamento se deu pelas vítimas ou por vizinhos e colegas.

 

Mais denúncias

A hipótese de terceiros fazer a denúncia aparece nos dados coletados pela Decode Pulse. Em um universo de 52 mil menções contendo indicativo de briga entre casais, realizadas entre fevereiro e abril deste ano, houve um aumento de 431% nos relatos, sendo que 53% dos relatos foram publicados na primeira quinzena de abril. É de se supor que o isolamento social possibilite ouvir conflitos que antes passavam despercebidos. Mas é também importante pontuar que a escuta de um episódio de violência não implica necessariamente na busca por serviços de denúncia. Se isso tem ocorrido, é possível que estejamos diante de maior conscientização por parte da população com relação a violência doméstica.

Os dois levantamentos realizados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública confirmam o que os dados já vinham sugerindo antes da pandemia. A violência de gênero vem crescendo no Brasil nos últimos anos e o feminicídio é sua expressão mais cruel. Os dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2019 mostram que a residência é o local mais perigoso para meninas e mulheres, e que os agressores são pessoas conhecidas, com as quais, muitas vezes, possuem um vínculo. São cidadãos “comuns”: pais, avós, tios, trabalhadores. Nada parecido com o estereótipo de criminoso construído durante a formação de policiais civis e militares, o que torna, portanto, mais difícil para esses profissionais lidarem com esse tipo de violência.

 

Violência cultural

Por se tratar de uma violência com raízes fortemente culturais, instituições policiais e do sistema de Justiça não vão dar conta, sozinhas, de enfrentá-la. Por outro lado, as polícias podem e devem compreender que violência doméstica é, sim, problema das instituições de segurança publica. Hoje, uma das principais demandas de atendimento do serviço 190 são os casos de violência doméstica. Mas dada a complexidade do ciclo da violência contra as mulheres, o que faz com que elas muitas vezes desista do registro da ocorrência, esse tipo de atendimento pode ser interpretado como frustrante ou de menor importância pelo policial.

Outro ponto importante é que esse tipo de atendimento não integra indicadores convencionais de produtividade policial. Esses costumam levar em conta ações como prisões em flagrante, apreensão de armas e drogas. Essa configuração faz com que as ocorrências de atendimento a mulheres vítimas de violência sejam vistas pelo policial como perda de tempo.

Os dados levantados durante a pandemia mostram, portanto, que não é a crise sanitária que causa a violência doméstica ou de gênero. O isolamento social agrava um problema que já era muito sério e acentua os fatores de vulnerabilidade. Essas mulheres, confinadas com seus agressores e com dificuldade em acessar os canais de denúncia, precisam da atenção das autoridades policiais e cidadãos. Estejamos atentos/as e disponíveis para nossas vizinhas, amigas, familiares.

 

Samira Bueno – Diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
Juliana Martins – Coordenadora institucional do Fórum Brasileiro de Segurança Pública
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